segunda-feira, abril 14, 2008

E AFINAL, A TRADIÇÃO
AINDA É O QUE ERA

Há quem não me dê razão, mas vou contar duas histórias em prova desta asserção.
Luanda, Angola, 1950.
No princípio desse ano gerou-se um clima de
justa indignação causado por um acontecimento recente.
O Chefe de Finanças dos Caminhos-de-Ferro era um homem já entrado em anos; não recordo o nome, mas sei que era uma pessoa muito respeitada por toda a gente, coisa rara naquela época (e por muito mais tempo depois).
Era negro.
Na ocasião aconteceu algo de grave nos Caminhos-de-Ferro necessitando de urgente intervenção.
Mas como era, e é, de nossa tradição, não havia verba disponível. Mas havia numa outra rubrica
liquidez suficiente para acudir com urgência à grave situação criada.
E o nosso responsável financeiro não hesitou em transferir de onde sobrava para onde fazia falta.
Processo disciplinar e demissão imediata porque:
“…a lei não permitia tal coisa sem antes se proceder a um longo processo burocrático, talvez inútil quando chegasse
…se chegasse.

A segunda história, mais recente (anos 60?) mas igualmente significativa, gira à volta de uma catedral
(virtual) e dos Musseques de Luanda, estes sim, bem reais.
Era à altura Presidente da Câmara um Veterinário, pessoa competente, ao que constava, mas não sei em qual das duas especialidades.
Surgiu nessa altura a ideia, mesmo um projecto, para erguer por sobre o Cemitério do Alto das Cruzes uma catedral assente sobre pilares de forma a preservar os jazigos e outros monumentos em que aquele histórico recinto era rico.
Obra faraónica sem nada comparável na cidade.
Levantou-se grande celeuma entre a população, e o assunto passou a motivo de conversas e acesas discussões.
Entretanto um jornalista pediu ao Presidente da Câmara que lhe concedesse uma entrevista, durante a qual, e entre outras coisas, lhe perguntou se não seria preferível tratar do saneamento básico dos Musseques onde viviam centenas de milhares de pessoas sem sanitários, sem água. (chegavam a ir buscá-la em latas e garrafões aos comerciantes da zona que a vendiam quase ao preço da água mineral). Os “sanitários” eram as barrocas onde os dejectos aguardavam pelo tórrido e bendito Sol que os secasse e os desfizesse em poeira espalhando-os pelo ar
que as pessoas respiravam numa eficiente reciclagem.
Mas no Cacimbo não havia Sol que os queimasse, nem chuvas que lavassem a terra. Era assim por mais de cinco meses desde o tempo de Diogo Cão, e assim continuou a ser.
Mas tradição é tradição e o Senhor Presidente argumentou que se tratava de “verbas diferentes”, e isso era um princípio sagrado.
Mas a Catedral nunca foi erguida, graças a Deus, suponho.

Mas o que foi que me trouxe até aqui desde tão longe?
Foi a Televisão onde acabo de ver e ouvir – hoje seis de Abril do ano da graça (?) de 2008 – que o carro de desencarceramento dos Bombeiros de Pataias, comprado em SEGUNDA MÃO há treze anos, entre outras bizarrias, só pega de empurrão (há mesmo uma imagem ilustrativa)

Há verbas astronómicas destinadas a obras gigantescas
de cuja necessidade não me atrevo a duvidar. Mas de verbas astronómicas que ainda por cima levarão anos a concluir e a pagar, e cujos orçamentos – sabe-se à partida – serão largamente ul