terça-feira, março 28, 2006

Auto- Sugestões

Auto-sugestões...
... são duas histórias semelhantes, separadas, no tempo por mais de vinte anos, e no espaço por mais de oito mil quilómetros A primeira é muito pessoal e bem poderia ficar desconhecida. No entanto não posso deixar de a divulgar pela paradoxal parecença/diferença com a segunda. No fim da minha adolescência, lá pelo longínquo final da década de trinta do Século passado, estava ainda em casa de meus Pais e, na ocasião, desempregado. Por isso procurava aliviar minha Mãe do peso de cuidar de três filhos pequenos. Um dia fui às compras e trouxe fígado para fazer iscas. Ao tempo quase todos os produtos à venda nas lojas de Bairro eram embrulhados em "papel pardo", um papel ordinário, grosso e pesado com bastante "peso" no peso/custo nos nossos levíssimo bolsos. Também no talho usavam aquele papel e eu cheguei a casa com as iscas numa deplorável e nojenta amalgama de fígado, papel e sangue. Lavei tudo com cuidado para tirar o papel do fígado, e da minha memória. Fiz a vinha de alhos como deve ser. Tudo impecável. Fui até junto de minha Mãe e perguntei: "oh! Mamã, acha que uma lavagem com duas águas é suficiente para tirar o gosto a sabão?" "De que é que tu estás a fala?" "do fígado. Para conseguir tirar o papel de embrulho tive de o lavar com sabão". e a minha pobre Mãe em pânico: "Ai homem o que tu foste fazer ! o Pai vai dar por isso e será um inferno" "Mas eu lavei muito bem em duas águas... já lhe pus vinagre, alhos e louro.." A minha Mãe ficou para morrer coitada. Combinou-se não falar disso a ninguém e... fosse o que Deus quisesse. Ao jantar, sentados à mesa ( o Pai na cabeceira, a Mãe à direita, eu à esquerda e a seguir as crianças ). A minha Mãe, à minha frente com uns olhos de pânico que já me faziam pena. Mas resolvi fazer uma pequena provocação: " então Papá, que tal estão as iscas. ? Olhe que fui eu que as temperei". – e ele: "Estão boas, estão muito boas". Mas ao mesmo tempo estranhou os olhares apavorados da Mulher e perguntou: "mas afinal o que é que há?" Aí, a minha pobre Mãe não aguentou; "imagina que este parvo foi lavar as iscas com sabão" " Mamã! Porque é que foi falar nisso"? atalhei eu, " o Papá não disse já que as iscas estão muito boas?" Então, o impossível aconteceu: "Bem! Disse o meu Pai, elas estão boas... mas eu sempre lhes achei um gosto esquisito" As crianças e as Avós já velhinhas juntaram-se ao coro e as iscas já sabiam mesmo a sabão a toda a família. Então indignei-me. "Mas Vocês tomam-me por um débil mental capaz de lavar as iscas, ou qualquer outra comida, com sabão ? Não vêem que foi uma brincadeira minha com a Mamã?" Não viram! Preferiram a versão "débil mental", pois não houve forma de os convencer e no decorrer do Tempo, sempre que o assunto vinha à baila: "as iscas sabiam mesmo a sabão". Esta foi uma auto-sugestão provocada por uma brincadeira que se voltou contra o brincalhão. Outra caiu-me directamente no "colo". Depois contarei..