o assistente

Como já disse, era um bom profissional, daí que quando se iniciava um filme e se procurava constituir a equipa, lá vinha a pergunta: "Ó João, quem vai ser o teu assistente?" Eu respondia: "Pois o José, claro." Descrita a criatura passemos aos factos. Estava praticamente acabado o último filme do Leitão de Barros e já só se trabalhava uns dias por outros a fazer alguns planos que a Montagem julgava necessários. Nessa altura a equipa, digamos "titular", já tinha transitado para outro filme. Vinham então outros colegas, geralmente menos experientes, fazer esses "planos soltos". Foi o que aconteceu dessa vez. Eu fui fazer "Morgadinha dos Canaviais" noutro estúdio, mas dessa vez não levei o José que ficou ainda na Tóbis, nos tais planos soltos. Nessa altura substituiu-me um moço que já tinha também sido meu assistente e tinha ascendido rapidamente – talvez rapidamente demais – a operador. O Realizador mandou fazer um "travelling" no exterior do Estúdio mas, queria-o com a câmara muito alta. O procedimento normal seria montar praticáveis – umas caixas geralmente de um metro por metro e meio, diferentes na altura e que se podem encaixar umas nas outras e só na de cima se põe a tampa. Montar-se-iam pois os praticáveis e sobre eles se poria o estrado para a deslocação do "charriot". Assim ia o José fazer quando o Realizador manda que se ponha um praticável de meio metro sobre o "charriot" e o tripé e a câmara lá em cima, mais o operador e o assistente. Era uma loucura. Além de que não faz parte das atribuições do Realizador a forma como é instalado o material de imagem. Teria sido a fúria de poupar tempo. O tripé e a câmara somavam largas dezenas de quilos e o "charriot" era de pneus e portanto molejava muito. O José quis contrariar a ideia mas o operador não teve força para se opor ao Leitão de Barros e não apoiou o seu assistente – como seria lógico que fizesse – e o José , que como já disse era bom profissional - tomou uma atitude firme, não colaborou na loucura e foi para o interior do Estúdio para não ver, e de onde ouviu daí a instantes o estardalhaço daquela coisa toda a ruir e a dar um prejuízo enorme, pois a câmara teve de ir a reparar ao estrangeiro.
Tive conhecimento do caso quase logo a seguir porque estava no Estúdio da Cinelândia (onde é hoje a Televisão), e a notícia correu célere. Dias depois encontro o José que vem muito choroso dizer-me: "Ó Sr.João, não calcula a desgraça que aconteceu ali na Tóbis, imagine que... interrompi-o. "Ó homem, não me venha com essa! Você deve estar a rir-se todo lá por dentro desde que a coisa se deu, se calhar até rezou para que aquilo acontecesse!" Sempre deve ter trazido alguma coisa do Seminário. Mas sejamos francos, pelo menos rir, daquela vez ele merecia.
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