Roxa xenaider

terça-feira, outubro 14, 2008

A “PANTUFADA”

Doce palavra esta!
Foi, talvez há mais de vinte anos que, tanto quanto posso recordar, a ouvi, fixei na memória e devo uma imensa gratidão à senhora que a pronunciou .
No tempo, pré Abecassis, ainda circulavam autocarros na Rua Augusta. E com que velocidade o faziam!
Havia várias paragens ao longo da Rua, o trânsito fazia-se no sentido Sul Norte e os carros que circulavam pelo meio da rua, ao aproximar-se da paragem, inflectiam para o passeio à beira do qual se organizavam as filas de espera.
Assim, como habitualmente acontecia, era eu um dos pacientes candidatos a passageiros.
A umas dezenas de metros mais diante da “minha” paragem havia uma outra para a qual se dirigia em grande velocidade, um autocarro, muito rente ao passeio para facilitar a abordagem,
Como as pessoas daquele tempo se lembrarão, o perfil da rua ere abaulado pelo que os carros vindo junto ao passeio, faziam com que o espelho retrovisor, uma peça de razoável dimensão, ultrapassasse o limite do passeio.
Subitamente sinto-me puxado para trás com violência e vejo passar no sítio onde momentos antes estivera minha pobre cabeça, que já lá não estava, e que aliás nem estaria mais, se uma senhora me não tivesse salvo a vida com o seu povidencial puxão, acompanhando o generoso gesto com o mais do que apropriado comentário: “ o senhor ia levando uma pantufada!”
O que são as contradições humanas! Já me não lembro da senhora, mas não esqueci a palavra; não mais usei chinelos.
Calço pantufas...

recordações

Recordações

Como sucede habitualmente de manhã, debrucei-me da janela e olhei o vasto espaço que tinha ao alcance do meu 10º andar.
Algo me fez reviver a minha longínqua infância: as brincadeiras e até as inocentes maldades que todas as crianças fazem e algumas vão fazendo e refinando pela vida fora, valha a verdade.
De repente dei por mim contemplando um carreirinhos de formigas.
Em seguida veio a costumada maldade: esmaguei o carreirinho e fiquei-me a contemplar a desordem que se estabeleceu naquele, antes tão bem organizado, cortejo.
As formigas escapadas à mortandade corriam desorientadas em todas as direcções.
Mas apenas uns curtos minutos durou o pânico e a desorientação. Pouco a pouco, muito pouco tempo aliás, tudo voltou à normalidade, o carreiro recompôs-se e retomou o caminho anterior.
Esqueci as formigas e voltei à realidade do presente.
À minha frente, em várias direcções e a diversos níveis, corriam
oito vias rápidas e por elas circulavam a grande velocidade, a hora de ponta já ficara para trás, inúmeros carros ligeiros e pesados a um ritmo quase alucinante.
A distância entre o meu ponto de observação e os diferentes laços
causava um efeito de tele-objectiva, como que “esmagando” a paisagem .
Assim se criava a ilusão de que os veículos que se deslocavam
da esquerda para a direita iriam colidir com os que circulavam em sentido contrário.
À tarde correrão em sentidos opostos. Assim foi nos dias anteriores,
assim será no futuro.
Alguém pisou no formigueiro.
Pus-me a especular e conclui: isto é apenas o “play-off” do formigueiro que é a Sociedade no seu conjunto.
E ninguém, parece interessado em levantar o pé.

segunda-feira, outubro 06, 2008

tremulo,claudicante (corrigido)

Trémulo, claudicante,
no seu fraque de bom corte,
de olho lacrimejante,
lamentando a sua sorte,
seguia o infeliz noivo
cumprino o sacrifício
de receber na igreja,
avantajada maquia
- servida numa bandeja –
que a velha noiva trazia.

Lá ía a filosofar:
“vou juntar aos meus trint’anos
os setenta e cinco dela.
que pouco pode durar.
E a vida há-de ser bela
com dinheiro pr’a gastar,
com todo o Mundo pr’a ver
e miúdas pr’a conquistar”.

E assim chegou à Igreja.
Postou-se junto ao altar
debaixo d'olhares d'inveja
de muitos dos circunstantes
esperando que a noiva chegasse
dentro de poucos instantes.
Esperou, esperou e desesperou
vendo os minutos passar
e da noiva nem a sombra.
Eis que da porta de entrada
vem um certo burburinho,
e a figura desesperada
de um solitário padrinho,
poisque não trazia a noiva.
O pobre vinha sozinho
trazendo a triste notícia:
“A velha noiva pisgou-se
com um moço de vinte anos”.
Por algum tempo pensou-se
que seriam grandes os danos.
com o “copo de água” pago,
com a cerveja a aquecer,
os rissóis a arrefecer,
os doces a derreter.
e os convivas esfomeados
com os dentes a ranger.

Foi então que o noivo deu
prova de sabedoria.
Erguendo os braços ao Céu,
diz: "obrigado Senhor
pela lição que me deste
não me deixando vender".
Deitou o fraque pr'o chão,
e,aliviado o coração,
abandonou a igrela
e seguido p'la comitiva.
lançou~se sobre a cerveja,
os doces e os rissois
e comeram sem parança
os pratos de caracois.
De todos,o mais contente
era o eis infeliz noivo
que, pobre mas conformado
fez honras ao beberete.
É,como diz o ditado:

"Pobrete, mas alegrete!"