Da Rainha Ginga... ao Presidente Craveiro
Angola, 1954. O Presidente Craveiro Lopes está de visita a Angola. Foram trinta e seis dias muito cansativos , que nos levaram aos sítios mais afastados e recônditos daquele imenso território. Houve vários mas breves encontros com populações nativas cada uma com seus costumes e língua próprios. O entendimento só era possível através de intérpretes das mais variadas origens : funcionários administrativos comerciantes da zona, um ou outro oriundo do mesmo povo ou missionários com longa permanência na Região. O caso a que me reporto, aconteceu no Leste, na Província do Moxico, cuja capital é Luso. Terras de Ganguelas e Luxases. Não sei exactamente em que local terá sido montado um grande palanque onde foram recebidos a Raínha N’hacatole, dos Luxases descendente da Raínha Ginga luzindo os seus trajes tradicionais, e o Rei dos Ganguelas, um homem alto e forte, mas sem nada que o inculcasse como Rei.. Trajava camisa e calça de caqui, tipo militar. Mas naquele palanque não havia nada onde fosse possível sentar. Presidente e comitiva, todos estavam de pé. Mas esta pobreza de meios, parecia radicar em algo passado muitos anos antes. Recuemos pois, trezentos anos. Estamos em meados do Século XVl l. O Governador João Correia de Souza recebeu no Palácio, em solene audiência, a Raínha N’ginga N’bandi ( Ginga ) e a sua comitiva constituída pelas mais importantes mulheres do seu reino. Num grande Salão do Palácio, rodeado de toda a sua Corte, Sua Excelência ocupava um opulento cadeirão senhorial em atitude Majestática que manteve à entrada de N'ginga N'bandi. Olhando em volta, a Raínha, não vendo sombra de cadeira, escabelo ou coxim em que pudesse sentar-se, mandou que uma das suas súbditas se pusesse "de gatas" e sentou-se sobre as suas costas. Em 1621,o exército da Raínha veio a derrotar o do Governador.. Em 1681 morre a Raínha Ginga, católica, batipzada com o nome de Ana de Souza
Saltemos de novo trezentos anos, mas agora em sentido inverso. Estamos de novo com o Presidente Craveiro Lopes,a Raínha KangaN’hetol e o Rei dos Ganguelas. O primeiro discurso coube ao Governador do Moxico, Dr Ramos de Sousa,angolano de origem caboverdiana, usando de um tom de voz forte mas empostado como o dos actores de outros tempos. A Raínha insistiu com o Rei dos Ganguelas para que falasse em primeiro lugar. Logo se verá porquê. O discurso foi tão longo quanto o protocolo e o intérprete o permitiram, rematando com a oferta de um boi ao Presidente Craveiro Lopes. O Chefe de Estado agradeceu a oferta, mas na impossibilidade de a transportar no avião, deixava o boi para que pudesse ser consumido numa grande festa do Povo Ganguela. Nos mesmos moldes falou a N’hacatole, mas terminando com um sorriso "malandro" e com dois dedos em riste, ofereceu dois bois. A gargalhada foi geral... ou quase. Não se riu o Rei dos Ganguelas que se terá sentido diminuído,e o Presidente. Aliás nunca o vi rir em toda a viajem .Mas bem faria em soltar umas boas gargalhadas de vez em quando.
É que fazem tão Bem à Alma !. . .
Não desejaria acabar esta história num tom pessimista, mas.. .não teria Presidente boas razões para não rir ?. . . .
Saltemos de novo trezentos anos, mas agora em sentido inverso. Estamos de novo com o Presidente Craveiro Lopes,a Raínha KangaN’hetol e o Rei dos Ganguelas. O primeiro discurso coube ao Governador do Moxico, Dr Ramos de Sousa,angolano de origem caboverdiana, usando de um tom de voz forte mas empostado como o dos actores de outros tempos. A Raínha insistiu com o Rei dos Ganguelas para que falasse em primeiro lugar. Logo se verá porquê. O discurso foi tão longo quanto o protocolo e o intérprete o permitiram, rematando com a oferta de um boi ao Presidente Craveiro Lopes. O Chefe de Estado agradeceu a oferta, mas na impossibilidade de a transportar no avião, deixava o boi para que pudesse ser consumido numa grande festa do Povo Ganguela. Nos mesmos moldes falou a N’hacatole, mas terminando com um sorriso "malandro" e com dois dedos em riste, ofereceu dois bois. A gargalhada foi geral... ou quase. Não se riu o Rei dos Ganguelas que se terá sentido diminuído,e o Presidente. Aliás nunca o vi rir em toda a viajem .Mas bem faria em soltar umas boas gargalhadas de vez em quando.
É que fazem tão Bem à Alma !. . .
Não desejaria acabar esta história num tom pessimista, mas.. .não teria Presidente boas razões para não rir ?. . . .
ecordações com vinte e cinco anos. O Domingos estava velho como seria de esperar, mas seco e desempenado como sempre o conheci. Disse-me que vivia no Bom Jesus, na margem direita do Quanza onde tinha um pequeno negócio. Despedimo-nos como quem não espera tornar a ver-se. E os anos correram. Mais quatro se passaram,e por razões de familia, resolvi com grande desgosto, deixar Angola. Lembrei-me então do Domingos, como estaria ele ? "estaria ainda" ? Resolvi ir despedir-me. Peguei no carro com a munha Mulher e um Grande Amigo que lá deixei e lá morreu passados poucos anos. Rumámos ao Bom Jesus. Na povoação foram um tanto reticentes em dar a morada do Domingos. Estava-se numa época ainda não completamente pacificada, e eles não nos conheciam. Enfim depois de muitos rodeios deram-nos a indicação da casa do Domingos. Com alguma dificuldade a encontrámos. Era uma pequena construção completamente isolada no meio do mato. A loja estava fechada e tudo silencioso. Bati à poerta de casa e algum tempo depois apareceu-me o Domingos muito debilitado. Estava doente, por isso estava a loja fechada. Enfim, foi um encontro breve e comovido. Ele e o Laranjeira, o Amigo que me acompanhava, trocaram endereços. Anos mais tarde este Amigo mandou-me notícias do Domingos. Agora só resta a recordação duma boa amizade e a fotografia que se inclui neste relato de um tempo que vem dos trinta e três anos e se prolongou até aos noventa, e agora... esperemos.